quarta-feira, 19 de março de 2014

Outros fragmentos...


IX

Beijei muitos chãos, clamei em vão, gritei aos céus,
fui um fiel. Nem o eco me respondeu.
Nem o frescor da brisa mansa.
O eterno dormia o sono dos justos e agendou
– para não sei quando –
a audiência com o comum dos mortais, os tais, filhos seus.
Fui santo-do-pau-ôco...

X

São de homens e de falos enrijecidos
as memórias da primeira noite.
Também de mea culpas plantados em mim
e seus medos.
A casa-paroquial foi abrigo e testemunha
da cópula primeira e seus tremores.
Prazer acordado remorsos.

XI

Pássaro criado em cativeiro, ensaiei o primeiro voo.
Provei o fruto proibido em lugar santo.
Recebi seus anátemas e convites.
Masculino e feminino fundiram-se em meu peito.

XII

Vivi amores que ousaram dizer o seu nome
e a solidão das madrugadas.
Gosto de homens e de seus membros,
enxertados de sangue, esperma e afeto.
 Ternura nos olhos e dedos.
Corpos sem vergonhas, 
alforriados dos guetos,
arco-íris acenando em praça pública seu orgulho homoerótico.
Transfuga – que sou – das prisões dos desejos lamuriantes
e seus interditos.

Moisés Augusto Gonçalves, in Fragmentos Impertinentes