quinta-feira, 30 de setembro de 2010



Procuro
aquele não primeiro
ao luso invasor,
à sua espada,
seus medos,
ganâncias,
sua cruz,
seus metais,
seu escambo
e seu olhar de coisa,
mercador de outros mares.

Procuro
a flecha que voa,
matriz guerreira,
que cravou no peito da terra-brasilis,
o canto vermelho das liberdades,
rompendo ao longe;
a utopia chamando na boca das florestas,
o espírito dos ancestrais bailando
aos sons do canto desolado da mãe terra,
órfã da nudez silvícola
suas vestes, signos e escolhas.

Procuro
o suor e sangue negro
- fecundos -
a revolta primeira,
que molhou nosso chão
inundando mentes,
corações,
campos e senzalas,
povoando amanhãs de esperanças.

Procuro
o bálsamo das lutas e fugas
das fugas e lutas
- codinome resistência -,
que forjaram Quilombos,
que pariram Zumbi,
Palmares,
lugares outros,
sem Casa-Grande.

Assim, o grande da Casa
se mostrou pequeno,
também a usina,
a fazenda,
a fábrica...

Procuro
essa força,
que rasga a história,
que seduz a memória
que recusa o Senhor,
o ter dono,
o ser-coisa,
o não ser-gente,
o não-futuro...
Um outro mundo possível...!

Crença,
verdade,
delírios?
Ou lições no calor das lutas...?

Moisés Augusto Gonçalves, in Fragmentos impertinentes